Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Íbis

«A íbis simboliza a parte infantil do seu ser - a infância conservada ou reencontrada. Pessoa ainda se sentia criança, e lamentava não ter podido ficar criança mais tempo. Ele gostava de crianças. Foi para os sobrinhos e para os primos pequenos que escreveu este curto poema:
«A Íbis, a ave do Egipto
Pousa sempre sobre um pé
O que é
Esquisito.
É uma ave sossegada,
Porque assim não anda nada.»
Para os divertir, fazia de íbis, mantendo-se de pé sobre uma perna, com a outra dobrada. E, quase quinze anos passados sobre o empreendimento falhado da casa Íbis, é a personalidade desta ave sagrada muito «sossegada» que ele assume quando escreve Ophélia, naquele estilo voluntariamente pueril das Cartas de Amor, que tanto contrasta com a sua prosa habitual: «Meu Bebezinho querido: Então o meu Bebé não ficou ontem descontente com o Íbis? Então ontem achou o Íbis meigo e digno de jinhos?...» O facto de ter colocado a sua empresa industrial e comercial sob o signo da parte dele próprio que menos pronta está para fazer face a tal desafio é cem por cento Pessoa, com aquela espécie de vontade de falhar, inconsciente e contudo inteligente, que nunca mais o deixará.»
Robert Bréchon. Estranho Estrangeiro - Uma biografia de Fernando Pessoa. Lisboa: Quetzal, 1996, p. 96.