Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Ficções do Interlúdio

«Ficções do Interlúdio, parece à primeira leitura ter a ligeireza de um jogo de palavras, de uma canção popular. Mas, para compreendermos o seu alcance, convém lembrarmo-nos de que este título, Ficções do Interlúdio, é o que Pessoa queria dar ao conjunto das obras poéticas dos seus heterónimos (Caeiro, Reis e Campos), na eventualidade da sua publicação num único grande Livro. Portanto, há provavelmente uma relação entre a própria ligeireza das suas canções (Plenilúnio, Saudade Dada, Pierrot Bêbedo, Minuete Invisível, Hiemal) e a natureza do empreendimento heterónimo. É a hipótese emitida por Patrick Quillier na análise que faz destes textos enganadores: .(Existe «dentro» da obra ortónima uma obra dos heterónimos: uma série de cinco poemas agrupados justamente sob o título de Ficções do Interlúdio. Ora, eles parecem evocar as máscaras e as danças carnavalescas de um Verlaine que de súbito ficasse gago como se pressentisse que o simbolismo evanescente tão largamente atento de facto aos imponderáveis, ao que outros chamariam as pequenas percepções, apenas se pode aprofundar em paganismo, já que este último é igualmente o triunfo das sensações, quanto mais não seja da menor de todas: as assonâncias e aliterações, são, com efeito, nestes textos, de tal forma sistemáticas e ásperas que dão uma nítida impressão de balbuciar litânico na expectativa de um acontecimento essencial...» Estas festas galantes solitárias, este jogo da cabra-cega de uma consciência meio ébria consigo mesma - talvez seja então esse o limiar que vai da ligação maníaca a um mim até uma invenção de outros tantos mim quantas as sensações a sentir, as ideias a pensar, as vidas a viver...»
Robert Bréchon. Estranho Estrangeiro - Uma biografia de Fernando Pessoa. Lisboa: Quetzal, 1996, pp. 346-347.