Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Unidade

«Acontece que a obra-vida de Pessoa tem uma tremenda unidade. Quem a quiser entender como obra de um blagueur, fica aquém do seu entendimento. Quem a procurar compreender na sua densidade críptica à luz de teorias, crenças e práticas mais ou menos ocultas - passa para lá da possibilidade de a alcançar.
Não é a nível das opiniões emitidas por Pessoa, ou por qualquer um dos seus outros, que se pode procurar o fio íntimo da coerência da obra mas sim numa atitude de fundo que, essa, está para além das manifestações, propositadamente várias, de uma personalidade que se quis poliédrica: a expressão lúdica de um temperamento «fundamentalmente religioso», como afirmou ser. Esse ludismo impediu-o de se tomar demasiado a sério nas manifestações da sua religiosidade e essa religiosidade deu sempre aos seus exercícios lúdicos um alcance de «ritual dramático». Foi assim que aquilo que chamo o romance-drama-em-gente saltou do espaço do profano (da brincadeira avulsa) para o do sagrado: é um «faz-de-conta» ritual a que Pessoa dedicou toda a sua vida e que até, de certo modo, foi a sua vida mais real.»
Teresa Rita Lopes. Pessoa por Conhecer - Roteiro para uma expedição. Lisboa: Estampa, 1990, p. 56.