Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Ultimatum

«A grande peça deste número único do Portugal Futurista, ao pé da qual tudo o resto parece esquálido e sem cor, incluindo as palavras provocantes de Almada, é o Ultimatum de Álvaro de Campos. Não é uma obra-prima. Este texto combativo é um texto extremamente anti-social, agressivo, quase monstruoso, com a sua patente falta de unidade de tom. Começa como um panfleto e acaba em profissão de fé. Abre com um ataque de cólera e fecha com um impulso de esperança fervorosa. Entre os dois, uma longa dissertação num estilo demonstrativo, didáctico, cheio de «primeiro» e «segundo», «alínea a» e «alínea b», raciocínios lógicos e fórmulas algébricas. Mas não há dúvida de que isso veio também espontaneamente; e o autor tinha as suas razões para não polir o texto. Pessoa é capaz de, sob o nome de Bernardo Soares, escrever uma prosa maravilhosamente harmoniosa, sem nada que fira ou que ranja; mas aqui põe Campos a escrever à machadada e à martelada. Faz dele um pensador brutal, desajeitado e surdo, que ele nunca foi antes e nunca mais voltará a ser a esse ponto: um atleta do pensamento e do estilo. Como se verdadeiramente não houvesse sido ao próprio Campos, mas ao seu emissário - heterónimo do heterónimo - que ele tivesse desta vez confiado a pena - ou antes, o teclado (sabemos que Campos bate directamente os seus textos à máquina de escrever).»
Robert Bréchon. Estranho Estrangeiro - Uma biografia de Fernando Pessoa. Lisboa: Quetzal, 1996, pp. 347-348.
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