Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Louco

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«A imagem do louco genial tem-se instalado no espírito não só do grande público mas até dos exegetas. Não é meu intuito - não estaria para isso habilitada nem isto me parece, aliás, o problema fulcral - estudar o caso «patológico» ou não, de Fernando Pessoa. O que importa, parece-me, é contrariar essa perspectiva instalada de um ser que produziu caoticamente, ao sabor das vozes e dos impulsos da sua loucura ou das vozes por que se sentia habitado, uma obra fragmentária, sem unidade possível.
Ao contrário do que alguns exegetas pretendem, tomando ao pé da letra afirmações que Pessoa faz - sobretudo pela voz dos seus outros, de Soares, em particular - o poeta não é apenas esse grande vazio, a mesinha de pé de galo de que as vozes que hospeda em si se servem para se exprimir. «Coração de ninguém» será, na medida em que um coração palpita e assegura, enquanto funciona, a vida do ser que comanda. A aparente disparidade dos fragmentos que constituem a obra pessoana tem a irrigá-la esse «coração», «de ninguém», embora, mas único, de todos, e a organizá-la a unidade de um só sistema circulatório.»
Teresa Rita Lopes. Pessoa Inédito. Fernando Pessoa. Lisboa: Livros Horizonte, 1993, p. 34.
* Cruzeiro Seixas, Estudo para mesa de mármore.