Ficheiro de citações bibliográficas sobre a obra de Fernando Pessoa

Quimera

«Uma vez caído neste abismo de desalento, julgaríamos que o poeta só teria o refúgio da semi-inconsciência em que o tédio se adelgaça até quase não doer [...]. Mas a poesia de Fernando Pessoa tem outra face, esta heróica, em que se procura superar o tédio pela intuição dum destino supra-individual. É a poesia da Mensagem. Em Campos e na Mensagem surpreendemos a oscilação dum mesmo espírito entre a desistência e o sonho a que se chama fé. Campos vê na sua melancolia a melancolia de um povo que teve um Império e o perdeu, ficando sem objecto para a sua ânsia e até sem forças para desejar. «Pertenço a um género de Portugueses / Que depois de estar a Índia descoberta / Ficaram sem trabalho» [...].
A Índia que o poeta busca, bem o sabe, só há dentro dele. O Longe a que aspira não passa duma quimera: «Viajar ainda é viajar e o longe está sempre onde esteve - / Em parte nenhuma, graças a Deus!» Mas se o poeta afirmar, num desafio quixotesco, a realidade da quimera? Porque não será mais real o que só existe dentro da alma?»
Jacinto do Prado Coelho. Diversidade e Unidade em Fernando Pessoa. Lisboa: Verbo, 1973, p. 127.